Religião Chokwe

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Nova Acrópole

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O povo Chokwe é um grupo étnico de origem bantu de aproximadamente um milhão de integrantes estendidos pelo Zâmbia, Congo, Angola, Botswana e Moçambique. As suas tradições religiosas derivam, em grande parte dos Lunda (e por isso, também dos Luba com os quais possuem grandes ligações). Como todos os bantus, dão grande importância aos antepassados ou ancestrais, até ao ponto de se considerar que a vida carece de valor se falta a sua presença, o seu poder, e pela responsabilidade ante os mesmos.

Estes Ancestrais (dos quais muitas vezes é difícil saber se, na realidade, se trata de espíritos de antepassados ou concretamente de forças invisíveis da natureza, ou seja, elementais ou devas) são considerados parte da família (como os Manes, em Roma) e consultados frequentemente pelos seus membros. O conceito sacralizado da realeza, tão importante na coesão do seu Império é o mesmo, e foi introduzido desde os povos Luba a partir de uma personagem mítica, o caçador de sangue real chamado Chibinda Ilunga.

Os reis ou governantes são representantes de Deus (KALUNGA ou NZAMBI) e o rei chokwe é chamado MWANANGANA que significa literalmente “o proprietário ou vigilante da terra” (conceito muito parecido ao do faraó egípcio, que também é possuidor e vigiante, senhor da Grande Casa; esta é a tradução direta do nome “faraó”. Como nos antigos reis de sempre, o rei chokwe é o responsável último pela fertilidade da terra, pelo bem estar do seu povo e ainda pela sua continuidade no tempo (ou seja, a sua sobrevivência como tal).

O Deus Criador do Mundo e dos homens é chamado SAMATANGANA (que significa precisamente, “criador”) e os nomes de Nzambi ou Kulanga para se referir o mesmo (já vistos nos povos Luba e Lunda) reservam-se para o aspecto misterioso, unitário e remoto do mesmo, o ser infinito e ubíquo (é possível que estas interpretações derivem dos contactos com missionários cristãos). Os desenhos na cerâmica, os entrelaçados da cestaria, o talhado das presilhas para o cabelo, cachimbos e bastões mostram as imagens associadas a estes espíritos dos Antepassados, dadores de riqueza, fertilidade e ainda status social.

Nesta religião é de destacar a importância da oratória, base da transmissão de valores, verdadeiro fundamento, dizem os especialistas, do próprio Império Chokwe que se degradou e acabou por se extinguir na cobiça da venda de escravos no século XIX. Eles próprios ensinam que a oratória serve como um mecanismo para ir mais além do reino do físico e alcançar o mundo metafísico.

Apesar de inspirados pelos Lunda na sua arte, os Chokwe são, ao contrário deles, claramente patriarcais e apesar de haver sacerdotisas, acabam por ser muito raras. No entanto, não devemos esquecer que para eles o sacerdócio não é exclusivo de uma linhagem, classe social ou estudos especializados (como em outros povos que já estudámos), mas que todo o homem ou mulher madura pode realizar as cerimónias e comunicar com os antepassados.

É muito conhecida no Ocidente a cerimónia de iniciação de jovens (Kumakanda ou mukanda). É de destacar também a Dança de Máscaras MAKISHI, de grande exuberância. O nome que recebem os iniciados neste rito (mukanda) é “aqueles que não pertencem ao reino dos vivos” ou seja tundanji. E cada um deles é associado a uma destas personagens mascaradas que vão estar vinculados a ele durante os três meses que dura a sua aprendizagem-iniciação.

Estes representam poderes divinos e caracteres ou conceitos divinizados, por exemplo CHISALUKE, o homem poderoso e rico com grande carisma espiritual, MUPALA, Senhor da Iniciação e espírito protector de grandes poderes divinos, PWEVO, a mulher ideal, alma da música que acompanha os rituais e danças, e o MAKISHI propriamente dito, o espírito de um Antepassado que morreu e volta ao mundo dos vivos para ajudar os jovens.

Actualmente esta dança, que provoca a delícia dos turistas, está a dessacralizar-se pois interpreta-se como um elemento festivo e folclórico, desconectado essencialmente da sua fonte.

As figuras dos Reis antigos entre os Chokwe, como em tantos outros povos, são uma chamada de responsabilidade para o novo rei, que não deve esquecer que a sua missão é garantir a harmonia com o mundo invisível e deste modo o bem-estar de toda a sua comunidade.

É também importante a cerimónia de gratidão e oferenda ao rio Cuango, onde participam homens, mulheres e crianças no início do verão. Oferecem comida, fazem libações de vinho e cerveja, cantam e dançam e, inclusive, evocam os Antepassados para obter deles orientação e amparo durante todo o ano.

Um notável elemento da espiritualidade chokwe são os desenhos geométricos que fazem na areia para comunicar com o mundo invisível e narrar histórias morais ou das suas próprias tradições, numa forma de memória mágica ou mnemotécnica sacralizada. Acompanham também provérbios, jogos, fábulas, adivinhas, costumes e ensinamentos animais, etc.

Estes desenhos, chamados sona são traçados com uma só linha (alguns têm várias) que percorre vertical e horizontalmente entrelaçando-se no meio em pontos e cruzamentos, como podemos observar aqui:

Alguns recebem nomes curiosos e evocativos como “o estômago do leão” e os matemáticos estudam estes traçados com curiosas propriedades topológicas. Devem ser realizados suave e continuamente e fazê-lo é uma prova de mestria dos akwa kuta que são os especialistas neste tipo de desenhos. Antes de traçar a linha e como ajuda memorística traçam uma série de pontos ortogonais que define o motivo desenhado.

Os chokwe da Zâmbia, nas suas iniciações (acompanhados pelos varões com a circuncisão) ensinam como as suas almas vêm das estrelas e toda uma série de mistérios esotéricos contidos numa espécie de livros em madeira, com símbolos, que são “lidos” cerimonialmente nesses rituais. Dado o uso que se faz desses livros, somado ao facto de estarem confeccionados em madeira, faz com que tenham de ser “recopiados” uma e outra vez, pelo menos a cada geração.

Em algumas destas cenas não é difícil diferenciar o conjunto das Plêiades a partir de onde, como diz a Doutrina Secreta de H.P. Blavatsky , vem o Grande Movimento; e também as estrelas do cinturão de Órion com o seu ângulo característico reproduzido na perspectiva aérea das 3 pirâmides na meseta de Gizeh.

 

José Carlos Fernandez

Director Nacional da Nova Acrópole

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